quinta-feira, agosto 17, 2006

Nada mais me apetece dizer

a não ser que,

tenho uma bandoleta na cabeça, com uma auréola de penugens de pato posicionada a meio do meu cocuruto, que me obrigou a fazer a seguinte ressalva ao vizinho do primeiro andar: eu tenho uma auréola de anjo na cabeça mas não estou maluca, é da minha filha (e não é, que coisa feia é mentir, que importa o que ele pensa, nem acredito que pus as culpas no anjo loiro que dormia ao colo do 50.000, e ela deve fazer de propósito, adormecer no carro, para não ter que subir a penantes a escadaria de Santa Marta),

os meus dentes estão azuis turquesa e prateados, tenho estrelinhas na mandíbula inferior, diz o senhor 50.000, que é como quem diz a uma criança que ainda tem pouca maldade, que ela tem um sorriso metálico, sim, novamente, vá lá que a senhora não teve o desplante de cobrar a sua burrice, e um ano e três meses depois de me ter libertado da ditadura do titânio, só espero voltar a emagrecer (para já, o jantar ficou no prato - a carne, também, estava dura como solas de sapatos da Inditex cosidos à mão por crianças de Felgueiras, a culpa nem foi do aparelho, ainda só sinto uma moinha irritante, um arrastar dos dentes teimosos do sítio onde sempre foram felizes, para o sítio onde eu quero que eles se mudem de armas e bagagens até que as cáries e as gengivites os separem) e que achem que eu sou uma miúda outra vez, ou, pelo menos, que tenho os 28 anos que efectivamente tenho (continuo a dizer que tenho 26, parei aí e não é por mal),

e o ortopedista da CUF, saído do casting do ER (é parecido com o Luka, mas o Luka é mais bonito, e hoje, particularmente, não sei se por me estar a explicar como me cortaria os músculos das pernas, não o achei tão encantador, estava assimétrico hoje, o senhor doutor, um olho mais acima que o outro, ele a apalpar-me os joelhos e eu concentrada na assimetria, sem retirar prazer nenhum naquilo, e a pensar, será tudo isto produto da minha imaginação, será que a recepcionista com cara de palito de fósforo também existe ou eu tenho mesmo que deixar as drogas, mas depois a rótula saiu de sítio e eu esqueci as divagações todas acerca da minha lucidez, da simetria e da estranha forma de cara da outra, e concentrei-me em entoar um sonoro camandro), lamentou profundamente, mas vai ter que fazer ponto de cruz nas minhas duas pernas – deixe-me casar com os joelhos intactos, pedi eu, e ele, que não usa aliança, sorriu e disse, O casamento faz milagres, quem sabe se não fica curada, e ainda me passou pela cabeça dizer um disparate a despropósito, mas sorri, ainda sem aparelho nos dentes.

8 comentários:

Isa disse...

tá LINDO o post. LINDO!
eu um dia explico-te tim tim por tim tim pq é que, e o que é q, gosto em cada post teu que digo q tá lindo. um dia explico, post por post. bjs

Luís disse...

Excelente como sempre mas parece-me excesso de ortodôncia.

Dia disse...

Este é um dia histórico, é o dia em que o Luís saiu da casca e comentou, pela primeira vez, o (T)ralha. É uma honra tê-lo por estas bandas.
Quanto a ti, querida Isa, companheira das paredes pintadas de laranja, o que seria destas pobres caixas de comentários sem ti...

fernando lucas disse...

Pior é pedir uma consulta de oftalmologia na marinha e receber uma guia de marcha para ortopedia.
Ou o médico sabia que iria partir um osso, ou tenho um olho de vidro e não sabia.
Acabei por não ficar bom da vista, mas felizmente também não tinha nada nos ossos.

AnadoCastelo disse...

Ui deve ser horrível andar com riso metálico. Essa coisa na boca não te incomoda?

Mary Lamb disse...

Deves ficar linda de aparelho nos dentes. Tenho saudades.

Dia disse...

Incomoda, incomoda, apesar de me dar um ar de enfant terrible. Mas assim, falo menos, e isso é uma virtude: saber estar calada.

Anónimo disse...

azul turquesa é uma cor linda e depois quando estamos caladas ouvimos muito mais :)
(digo eu que falo muito)