quinta-feira, dezembro 29, 2005

Ainda não é a história do Pap'açorda. Os posts são como as cerejas.

[Reeditado]

Claro que não reparou nos candeeiros. Era novinho, loirito, não era nada feio e eu tenho pena que não me chegue um espécime destes, que eu nunca vá ser feliz com um indivíduo que possua apenas boa aparência, corpo torneado, que saiba montar candeeiros e pendurar varões de cortinados, não me basta que dê oito seguidas de manhã, outras tantas à tarde e à noite, eu sei que não é por aí, não vale a pena sequer tentar, eu disse isto à Clara, durante o almoço económico de há um mês atrás, umas tostas merdosas à beira mar, os dois directores das publicações mais vendidas de Portugal penso que ouviram a minha clarividência súbita, eu, estranhamente, nem estava a falar alto como é costume, mas também não sussurava, acho que me ouviram mesmo e deram ordens automáticas e vitalícias aos seus cérebros para nunca me virem a contratar seja em que circunstâncias for, um do meu lado direito, o outro do meu lado esquerdo, disse isto à Clara, a minha companheira de desterro, que sempre que está comigo me pergunta por gajos e a minha resposta é sempre a mesma, nada, nada, nada, mas acho que descobri a pólvora desta última vez, eu respondi isto à Clara e acredito mesmo que esteja certa: eu só vou sossegar, eu só vou ser feliz, só vou ter paz, ao lado de um homem que seja mais inteligente do que eu.
Da mesma forma que a Magui justifica a má sorte com o sexo masculino com o facto de ter passado a vida a procurar um homem igual ao seu pai, Manuel Lourenço de Oliveira - não encontrou na sua demanda, pela vida fora, nenhum exemplar que chegasse aos calcanhares do meu querido avô -, eu preciso de um homem inteligentíssimo para me amansar.
A Magui confessou-nos isto, a mim e ao Hugo, no dia de Natal, e ò Pai Natal, esse post está em draft, não sei se sairá desse estado vegetal algum dia, mas tu não sabes como me fizeste feliz, o melhor presente de sempre, um Natal com o Hugo, coisa que não acontecia há vinte anos, ainda para mais de surpresa, mas, voltando ao que interessa, estávamos os dois na cozinha, a tecer considerações sobre o amor, o desamor, a vida e para que é que cá andamos e a Magui intromete-se na conversa entre dois primos que se amam como irmãos, que são praticamente da mesma idade, um mais problemático que o outro e, zás, diz-nos isto do pai e eu não ando a procurar sacanas como o meu pai, apesar de o meu pai verdadeiro, o mano Leonardo ser a pessoa mais inteligente que eu conheço, aquele que eu tento que tenha orgulho de mim, o que se me dissesse "apaga o blogue que ainda te fodes" eu nem pestanejaria e carregaria no delete, se calhar até podíamos analisar por aí, ando à procura de uma réplica do meu irmão, ou então, voltamos à teoria dos pais biológicos e o meu é um sacana ímpar e, de facto, tenho feito um casting rigoroso, têm-me calhado uns na rifa indivíduos com o mesmíssimo calibre do meu dador de esperma, vampiros de emoções, capazes das coisas mais impensáveis; e, depois de a minha mãezinha me ter inquietado com isto, voltou a meter-se nos nossos diálogos existenciais e disse também que a vida não passa de um dia após o outro, disse isso com uma paz que eu, provavelmente, nunca terei, porque eu sei que só serei feliz com alguém que seja mais inteligente do que eu, alguém que me inspire numa base diária, que faça revelar o melhor que há em mim, que me faça aprender com prazer as coisas mais bizarras, que me desafie numa base horária - há uns anos, eu tornei-me expert em direito do trabalho, não porque estivesse apaixonada pela minha fonte, mas porque ele era mais inteligente do que eu, anos luz mais inteligente do que eu e, por isso, porque ele era inteligente e adorava passar conhecimento, eu serei ainda, provavelmente, a jornalista que mais sabe em Portugal sobre contratação colectiva -, e venham as tendinites todas de tanto escrever, venha a miopia de tanto ler, fique sem pestanas de tanto estudar, vinquem-se as olheiras de não dormir, porque eu sei que só poderei ser feliz assim.
Entretanto, distraio-me com rapazinhos bonitos, como o que veio cá dar à luz, que se deixam hipnotizar apenas com decotes profundos em vê, de renda preta, do "cache coeur" (gosto tanto desta palavra e tenho milhares destes casaquinhos traçados) que a Magui me ofereceu no Natal.
Não olhou para os tectos, não viu candeeiros, na verdade, não elevou o olhar para lá do metro e setenta que os saltos me emprestaram esta tarde, e como já estava escuro cá em casa e não havia electricidade, eu tinha umas velas acesas na janelinha da cozinha bordel, e toda a gente sabe que uma mulher, qualquer mulher que seja, pode até nem ser um mulherão, à luz amarela e difusa das velas, qualquer coirão ganha graciosidade, qualquer tez baça ganha luminosidade, e eu até nem sou feia, o meu problema não é esse, é a saliência que a minha inteligência um pouco acima da média me dá, coitadinho, não tinha mesmo hipótese de reparar nos candeeiros.

Um abraço ao meu querido Mac, um amigo que está sempre lá, o amigo que me veio desligar a electricidade às dez da manhã, trepando por um escadote acima e correndo perigo de electrocução, um amigo que, cheira-me, é mais inteligente que eu, mais psicopata que eu (esteve a ajudar na decoração da cozinha com os caixotes), mas que foi apanhado primeiro pela minha melhor amiga.

5 comentários:

Mary Mary disse...

Simplesmente fantástico... :)

Isa disse...

muito bom. e n desvies a concentração no que de facto queres para ti, bjs

Anónimo disse...

Mais depressa te diria para editares em papel o blogue do que para apagá-lo.

LR

Ossos disse...

Um gajo mais inteligente do que tu? Dificil...Faz como eu e considera a hipótese de viver sem eles...

MPR disse...

Um amigo mais inteligente apanhado por uma amiga? Só prova... os bons ou estão ocupados ou são gays... ;)