segunda-feira, janeiro 09, 2006

Histórias

Eu sou uma mulher atormentada.
Por uma história que não posso, que não quero, que não devo escrever.
Porque sei, se eu a bato no teclado com força, com a força que me destrói as unhas do dedo indicador e pai de todos das minhas duas mãos (mais da direita que da esquerda, é verdade) - e a manicure, brasileira, tom de pele de galão de máquina clarinho, diz: "Nossa, Diana, suas unhas estão fraquinhas, fraquinhas, elas estão lascando, tem que comer gelatina", e eu explico à Rose que elas estão fraquinhas porque eu escrevo com raiva, escrevo quase possuída, ela não sabe que eu passo mais de oito horas da minha vida a escrever -, se eu atiço a tendinite num qualquer teclado, neste, branco, ou no outro, preto, ou seja, se ponho tudo preto no branco, e como esta história é psicadélica e feita de coincidências atrás de coincidências, ela é tudo menos monocromática em gradientes de cinzento, ela é fluorescente, conta amores imperfeitos, impossíveis, traições, ela conta surrealidades várias, ela é um misto de romance Arlequim semi-erótico, ela é um pouco de policial da Agatha Christie também, e se eu a escrevo no papel, ou numa qualquer aplicação de edição de texto, estou a aceitar que ela existiu mesmo, que não foi um delírio que começou no Snob e ninguém sabe onde acaba (há quem diga, isto vem nas revistas que se compram por debaixo dos balcões dos quiosques lisboetas, que o autor da história - não sou eu, certamente, nem nos meus sonhos mais loucos eu teria imaginação tão fértil e tão perversa para escrever esta novela - escreveu e gravou vários finais: "round and round it goes, where it stops no one knows", roubado da Carrie).
E eu não sei ainda escrever sobre coisas que não existiram. Um dos leitores que eu não posso linkar, perguntava-me há tempos, com a sua curiosidade científica, se era tudo verdade o que eu escrevia, e eu respondi-lhe que sim, que não sei escrever com letras que sabem o caminho de cor, que sabem quem é o seu par na roda, elas, as letras e as comadres palavras não se entendem nas frases, atropelam-se quando eu estou a escrever sobre coisas que não existiram. Às vezes, muitas das vezes, pronto, admito, junto uns pózinhos de perlimpimpim às histórias reais do meu quotidiano, para as tornar fabulosas, e todas as existências são fabulosas, até a senhora da limpeza já foi musa de um post, dos mais bonitos, aliás, dos que não têm tantos ou mais caracteres como um destaque de página dupla de um qualquer diário português, foi um post escrito à pressa na véspera da véspera de Natal, mas eu não escrevo a metro, não faço questão de escrever muito, não é premeditado, sai ou não sai, às vezes as letras vão dar grandes passeios ao bilhar grande, outras vezes vão só à esquina comprar cigarros (e este post está a ser escrito em carência absoluta de nicotina; estou em ressaca tabagística, ontem fumei dois maços). É assim.
E esta história não existiu. Qualquer semelhança com a ficção é pura realidade, passa este aviso grande velocidade e a letras miudinhas na tela. Eu não a escrevo, também, porque eu não consigo descrever o anti-herói deste conto. Eu não sei quem ele é, tem os olhos baços, opacos, sem brillho, são muito escuros e pestanudos. Mas não sei mais nada sobre ele. Eu pensava que sim, que o conhecia, que sabia que era um homem bom que estava numa encruzilhada. O herói desta tragédia, esse, acho que ainda não apereceu na trama. Há vítimas. Há três vítimas. Número perfeito de vítimas.
Um dia, saberei escrever sobre histórias que não vi, que não aconteceram comigo ou seja com quem for, histórias que vivem apenas na terceira minhoca do meu cérebro a contar de trás, numa terra verdejante com casas feitas de baralhos de cartas. Ando a estudar para isso. Vou no carro, estou parada nos semáforos, numa fila interminável dentro do túnel da avenida da República, estou a comer uma sopa no Picoas Plaza e a dar migalhas de pão aos pardais, com a Moleskine semi-desfeita como companhia, como única companhia, e invento histórias para lugares, para personagens da minha cidade, para as pessoas que passam ou estão sentadas na mesa que está à minha frente.
Estas personagens existem, porém, estes lugares também. Com treino, com dedicação, um dia próximo, não muito distante, estou confiante que sim, começo a inventar as minhas terras, as minhas gentes, os seus nomes, as suas roupas, os seus tiques e manias. Está tudo cá dentro, na tal minhoca do meu cérebro, que cada vez é maior, que cada vez tem mais castelos de cartas de naipes encarnado.

9 comentários:

Dia disse...

PS- este texto não foi relido, é capaz de ter algumas gralhas e falhas de pontuação.
Desculpem qualquer coisinha, sim? Boa noite, vou ver dos Pestanas, se eles estão especados à minha porta.

Mary Mary disse...

É giro ver agora estes posts e associar a alguém... É engraçado! E para todos os que lêem esta Tralha e que tiveram ontem no jantar, um grande BEIJINHO, sim porque sei que andam aí (gargalhada)...

Eu sou como tu, por mais que tente não consigo imaginar histórias fictícias, não consigo escrever sobre outras coisas a não ser as minhas... Um dia havemos de conseguir... :)

Mary Mary disse...

Outra coisa que não tem nada a ver... Roubei a foto da minha mão e pus como principal do meu blog... Hihihihihihi!!! Gostei imenso dessa e da outra também... :)

Anónimo disse...

Jinho, p..rra é muita gira!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
.
Esta semana vai ser do pior..........não vou ter tempo para te melgar..............snif!!!!!!!!!!!!!!!!!
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Da-se ainda bem que não fui ao jantar!!!!!!!!!!!!!!, é que roer as unhas é um passatempo do je...........

Anónimo disse...

Por vezes as vitimas tornam-se executores e os caçadores passam a ser caçados.
Por vezes os anti-herois são punidos pelo q fazem.
Por vezes

Carrie disse...

Com tudo isto, como acreditar que comandamos as nossas vidas? Vivemos na ilusão que sim, mas anda alguém lá em cima a puxar os cordelinhos, ai anda, anda. Por isso gosto da minha (nova) impulsividade. De fazer o que não fiz quando tinha 20 anos, de viver a vida como ela é. Olha, gosto da ‘calimera’ ela é (sem patrocínio da TMN)…

Carrie disse...

Adenda: Onde se lê "gosto da ‘calimera’ ela é", deve ler-se "gosto da ‘calimera’ COMO ela é", sendo que a Calimera sou eu mesma.

Filipe Simões disse...

Eu acho que tu escreves super bem porque como tu dizes e bem só consegues escrever sobre ti e sobre as coisas por que passas.
Tu só tens de te ser tu mesma e escreveres com sentimento.Não tens de escrever sobre o imaginário ou sobre ficção.
Adoro ler-te,foi assim que te conheci mesmo estando longe e sendo um desconhecido para ti.
Beijinhos Dia.

ps: Um pequeno piropo,Diana estás linda na foto.(aliás és linda).

Apenas mais um disse...

Escrevo, apenas porque te li.