segunda-feira, abril 04, 2005

Carlos Augusto Stucky

O homem do googalize it, quando googaliza o seu nome não aparece nada. E ele googaliza-se amiúde, como eu: é sempre bom saber o que dizem sobre nós no imenso ciberespaço, porque somos como o outro - gostamos que falem sobre nós nem que seja para dizer bem - , mas o segredo do sucesso de pessoas incómodas como eu e o Carlos Augusto Stucky, é saber sempre o que os outros sussuram (ora aqui está um verbo que eu amo: o sibilante "sussurrar", quase impossível de dizer sem lançar uma chuva de perdigotos - outra palavra bem gira - quando se usa aparelho nos dentes) sobre nós.
Nicles. Rien. Népia.
Ele já me tinha avisado do seu anonimato electrónico, confessou-o com alguma tristeza embargada na voz, nas escadinhas tranquilas e recatadas numa travessa perto do Bicaense, enquanto fazia um cigarro de substâncias ilícitas, à holandesa (já cá faltava, parece que esta nacionalidade me persegue desde o Natal), especialmente para a Qui Qui.
Parece impossível que este brasileiro, natural de Porto Alegre (o Estado mais rico do Brasil), 43 anos (parece, no máximo, ter a idade inversa, lida ao espelho, 34 anos), nunca tenha sido citado numa qualquer webpage dos milhões e milhões existentes na Internet. É que ele, e a vida de capote errante que escolheu, davam, pelo menos, uma hilariante sitcom.

Naturalmente, Stucky, se eu me deixar desta vida de escrever sobre buracos nas estradas e espaços verdes ao abandono, e me dedicar a escrevinhar textos (livros, argumentos, crónicas, seja lá o que for) não só para as duas dúzias de leitores deste blog (grandes leitores, diga-se de passagem: o que importa não é a quantidade, mas sim a qualidade, e a propósito, fiquei meia encabelada de o meu irmão ter declarado, a meio do almoço de família de Domingo, que cá vem espreitar, que gostou do texto do papiro, porque, enfim, não lhe chego aos calcanhares, e agora até tenho medo de escrever), tu serás uma das minhas melhores personagens, com certeza, uma das minhas predilectas.
Eu conheci o Carlos Augusto Stucky em Olinda, Pernambuco. Num restaurante lindíssimo, com vista para um manto de buganvílias magenta, que enquadravam lá longe Recife e o mar. Minutos antes de o conhecer, numa praça também em Olinda (que é mesmo linda, património mundial da Humanidade, reza a história que se chama Olinda, porque quando foi decoberta alguém exclamou: Oh, linda!"), dois velhotes nordestinos, rugas esculpidas numa cara muito bronzeada, cantaram-me uma ladaínha em troca de alguns reais e vaticinaram uma grande paixão com o rapaz que estava a comprar duas cervejas Brahma.
Gordinho, com pouco cabelo, mas com uma gargalhada idêntica à minha, o Stucky conquistou-me quando, em Maria Farinha, no Hotel Amoaras, propriedade de um português seboso, sobejamente frequentado por putedo (o Hotel, não o proprietário seboso), ao abrigo das conhecidas rotas do turismo sexual do nordeste brasileiro, disse, para todo o mundo ouvir: "Atolei o pé na merda!".
E tinha mesmo, literalmente, atolado o pé na merda. Maria Farinha e o hotel Amoaras eram uma lixeira a céu aberto, eu deveria ter desconfiado que o romance que os velhotes cantaram acompanhados de um violão não podia correr bem, por ter começado ali, num quarto em que o ar condicionado parecia estar com problemas gástricos.
Era talvez o quarto dia em que eu não conseguia dormir. Por causa do calor, por causa das noites que passávamos a dançar forró, por causa das pessoas encantadoras que acabáramos de conhecer: a Bia, do ministério do Turismo, depois o Stucky, que se pendurou à "colectiva" de imprensa que foi conhecer Pernambuco a convite da TAP e do Governo pernambucano (o Stucky trabalhava para um operador turístico italiano), e já na recta final da viagem (os melhores momentos daquela viagem em que eu vim magríssima e a achar que tinha encontrado um grande amor - sou sempre a mesma idiota...), a Valéria e o Tio Dá Dá, nossos anfitriões no paraíso ao qual deram o nome de Porto de Galinhas.
Queria absorver tudo - o meu brasilian dream, como eu lhe chamei num álbum de fotografias que não ouso desfolhar há pelo menos dois anos. Dormir estava fora de questão.
Passámos essa primeira noite no Amoaras, a rir à gargalhada com as histórias do Stucky, entre banhos de piscina, dezenas e dezenas de caipirinhas, e incontáveis maços de Carlton. O Stucky tem esse condão, de ser o centro das atenções, um magnetismo inexplicável - a Qui Qui que o diga, jantou com o homem e esteve com ele meia dúzia de horas e agora passa o dia a gmailar-me: "Quando é que escreves sobre o Stucky, quando é que escreves sobre o Stucky?"
Mais de três anos depois daquela viagem maravilhosa a Pernambuco, eu raramente falo com os jornalistas que descobriram aquele Estado do nordeste brasileiro comigo. O homem a que a ladaínha dos velhotes de Olinda se referia, para além de ter um grave problema de erecção no pouco tempo em que esteve comigo, casou-se com outra poucos meses depois.
Fui mantendo algum contacto com o Stucky pelo Messenger, mas ele seria apenas uma boa recordação no baú do meu brasilian dream, se a minha vida e a dele não tivessem dado umas cambalhotas, seguidas de piruetas e mortais encarpados - eu grávida de um pulha e ele órfão de pai e mãe.
Reencontrámo-nos, mais uma vez, com a bênção do software da Microsoft, e o mar trouxe-o até a mim. Já por duas vezes.
Chama-nos fadinhas, a mim e à Carolina, e sabe-me bem, saber que há alguém, algures no meio do Atlântico, que gosta de mim incondicionalmente, tal como sou - insconstante, mais depressiva que maníaca. Disse-me para nunca perder o dom de me apaixonar com a violência de um vírus terrível. Que me hei-de dar bem.
A ele, sabe-lhe bem ter um porto seguro numa cidade tão bonita como a de Lisboa. E vai-lhe saber bem, da próxima vez que se googalizar. Espero que gostes, Stucky.

6 comentários:

Anónimo disse...

ora ai está o que há tanto esperava!
um grande beijinho para o homem googlize it, de quem fiquei fã!
um um muito obrigado pela reliquia "made in Amsterdam"!
tens de voltar stucky pra ficarmos lombrados! :)

Anónimo disse...

Uma homenagem mais que merecida, diga-se. Falei sobre ele, com toda a gente que encontrei, nos dias seguintes a essa histórica saída! M

Anónimo disse...

Nossa...de raro acontece que eu fique sem palavras...

MAGAÇA disse...

"Desejo para ti o quadrado do que espero receber de alguém.Muito amor no coração e muita paz nesta cabecinha azul." Estas são suas palavras num cartão de 25/12/77.
Que bom sentir agora uma saudade louca de nossas "gauchadas de adolescentes", que ainda somos,rsrsrsr.Mil beijos da amiga de São Léo.MAGAÇA

Unknown disse...

Venho de vez em quando ler esse post... me curtir... Beijo.

PS. Magaça!!!! Nossa... Quem imaginaria que lá em 77 nos deixamos e a Diana nos faria aproximar ... depois que nos falamos no freela, não nos cruzamos mais... Onde andas... liga... vem passear no Rio...

Jeferson Guilherme disse...

LINDO!