Vampiro
O Zé Ralha e a Magui conheceram-se numa exposição de pintura da Mocidade Portuguesa. O destino fez das suas nesse dia e a Magui foi chamada, à ultima da hora, para substituir uma outra menina de "coro" queia tocar Chopin à exposição.
Existe uma foto desse dia. Uma foto da Magui a tocar piano. É um retrato a preto-e-branco. A Magui está seríssima, com o olhar perdido na pauta. O seu rosto de porcelana está reflectido na cauda preta brilhante do piano.
Tinha vestido um blazer escuro. Emblema da Mocidade Portuguesa cozido ao peito. A indumentária ríspida da organização criada por Salazar contrasta com o seu aspecto frágil.
A Magui tinha 21 anos e era um anjo. Parecia retirada de uma tela da Renascença, uma qualquer virgem Botticeliana, perfeita.
O Zé Ralha não é, nem nunca foi bonito. Tez muito escura, cabelo encarapinhado - quando conheceu a Magui tinha o cabelo ao melhor estilo "capacete", popular nos anos 70. O maior complexo do Zé Ralha (e de toda a sua descendência) sempre foi ser gordinho.
O Zé Ralha, aos 18 anos, tinha um futuro brilhante à sua frente. Tinha como mestres Ernani de Oliveira, Lima de Freitas e Manoel Lapa (de quem chegou a ser assistente, parece-me).
Aquela foi a primeira exposição do Zé Ralha.
O Zé Ralha não se apaixonou pela Magui quando a ouviu tocar Chopin. Bem pelo contrário, e mau como só ele sabe ser, até gozava bastante com a prestação musical da Magui nesse dia. Eu acredito que ela tocou sublimemente bem. Eu acredito que ela deixou de tocar piano por causa do Zé Ralha.
A Magui é que se apaixonou perdidamente pelo Zé Ralha.
Tocou o seu Chopin, ganhou coragem e, protegida pelo uniforme da Mocidade Portuguesa, foi ter com o grupo de jovens "hippies" artistas. Interpelou o Zé Ralha e disse: "Eu quero fazer parte do grupo".
E o Zé Ralha mordeu-lhe o pescoço.
Tudo começou assim.
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