Nome comum: Papiro
Nome científico: Cyperus alternifolius
Família: Cyperaceae
Categoria: Vivacias
Origem: Africa tropical (sobretudo Egipto).
Folhagem: Persistente
Floração: Final do Inverno (flores brancas, deliciosas)
Altura: Entre 2 e 4 metros
Crescimento: Rápido
Transplantação : Primavera (através da divisão dos seus rizomas)
E, se de repente, numa bela tarde de Sábado (em que não comprei sapatos, mas na qual gastei o equivalente a um bom parzito de stillettos Pura Lopez em dois trapitos da cadeia do melhor amigo do Ingvar Kamprad, dono do IKEA), era dia do Pai, depois de ter descido o Chiado, de ter batido de trás para a frente a Rua Augusta e a Praça da Figueira
(que está cheia de putas por todo o lado - eu dizia, atónita, à Mónica, que mais uma vez me passeava, numa tarde de Sábado: 'não, não pode ser, as senhoras devem estar à espera de alguém, de boleia...' e ela, naïf como eu, balançava a cabeça para a direita e para a esquerda, como quem pondera o 'talvez', mas o raio das mulheres, que até tinham muito bom aspecto, insistiam em dobrar a perna de encontro às fachadas dos prédios pombalinos onde eu gostava de morar e agumas até tinham banquinhos desmontáveis e as mais pobrezinhas improvisavam-nos com caixotes de madeira, aqueles onde vem acondicionada a fruta, à espera de clientela),
dizia eu, se em plena Praça da Figueira, depois de ter descido ao submundo do Martim Moniz, onde se falam todas as línguas menos a portuguesa e onde eu até me misturo incógnita, sem destoar, pela herança genética que carrego e que está estampada na cara, para encontrar um ATM que não estivesse "Em Actualização", ou "Com dificuldades de comunicação", e que regurjitasse, com a satisfação de dever cumprido, uma nota de dez euros, para comer um croissant na Confeitaria Nacional, onde eu nunca tinha entrado na vida, mas onde a minha querida Astride queria satisfazer a gula. "São maravilhosos", disse ela acerca dos ditos croissants (os melhores que eu já comi são na esquina do Dave), depois de ter gasto também um dinheirão em roupa (o top de seda azul petróleo ficou-me no goto).
se, numa tarde até calma, cinzenta, ameaçando chuva, se depois de tudo isto, nos aparece à frente um indivíduo muito moreno, vestido de preto, cabelo cor-de-prata encarapinhado e com três papiros com mais de dois metros de altura na mão, tenham medo, tenham mesmo muito medo... - conseguiram entrar no vórtice que é a minha vida, um mundo onde acontecem as coisas mais bizarras e inéditas (e desta vez eu tenho testemunhas, a Mónica viu tudo, pode atestar que não sou eu quem inventou ou sonhou com o homem dos papiros).
Fomos atraídas, ao mesmo tempo, para a exótica vegetação, que se assemelha a uma cabeleira postiça verde. Os meus olhos subiram, perfeitamente sincronizados com os da Mónica, à altura dos gigantes papiros e desceram, também, na mesma fracção de segundo, com a curiosidade louca de saber que vagabundo excêntrico era aquele que medingava por trocos, apoiado em três papiros (eu sabia que eram papiros, a Mónica desconhecia o nome da planta). Ao mesmo, os nossos queixos caíram e das nossas bocas esvoaçou a frase: "Olha, é o meu (ela disse 'o teu') pai".
Olhei para o Zé Ralha e naquele instante em que franzi a testa e fiquei com a ruga de expressão igual àquela que ele tem entre as sobrancelhas, fui transportada em fast forward para um futuro não muito distante. Um futuro em que o Zé Ralha já não tem o meu avô a amparar-lhe os golpes baixos, um futuro em que terá estoirado em menos de um ano todo o dinheiro que recebeu de herança - em papiros e noutras espécies exóticas (a quinta do meu avô tem mais espécies vegetais que o Jardim Botânico) e, claro, em vinho e whiskey -, nessa altura, ele estará ali, algures entre o Rossio e a Praça da Figueira, mais cabeludo, admito, com grandes barbas prateadas, imagino, talvez a fazer uns desenhos porreiros em troca de um copo três, prevejo.
E, nessa altura, tal como fiz nesta tarde em que se comemorava o dia do Pai, entrarei, sem olhar para trás, sem hesitar, na Confeitaria Nacional, para comer um croissant.