terça-feira, setembro 20, 2005

Morrer de Tristeza

Na minha rua, para além de passeios estreitinhos esventrados pelas obras da EPAL, e de homens das obras de aspecto duvidoso e palavreado que até a mim me faz corar (é obra: hoje, às oito da matina, um mulatito dizia a um outro, de aspecto libanês: vai levar no cú, filho da puta... Nem abrir buracos tu sabes, ò paneleiro de merda! E o libanês: abrir buracos só se fosse o do teu cú, preto de merda! E trocam estes mimos, em frente aos polícias que disciplinam o trânsito e o estacionamento caótico da rua e dos "engenheiros" da EPAL que coordenam a empreitada, no equivalente ao volume 43 do meu auto-rádio e, assim, toda a vizinhança acorda com este bonito palavreado), mas, na minha rua, para além de picaretas e canos de água a brotarem da terra como que por geração espontânea, há um canito a morrer de tristeza.
Foi abandonado no Largo de Andaluz há pouco mais de uma semana e, desde então, vejo-o definhar, dia após dia. É um animal lindíssimo, entre Retriver e Setter Irlandês, enorme, e tudo me diz que foi para o olho da rua porque não se armou em raquítico e cresceu demais.
Tenho-lhe levado de tudo um pouco que existe na minha dispensa minimalista: bolos, queijo, lasanhas do Lidl, secretos de porco preto, e ele pura e simplesmente se recusa a comer seja o que for. Está em greve de fome, está triste demais, já é um esqueleto ambulante, olhos sem expressão, fica deitado o dia todo ao sol, num montinho de areia das obras da EPAL, não come, não bebe, espera os donos e a morte.
Estou a descongelar hamburgueres e a pensar no que posso fazer. Apetece-me dizer-lhe baixinho, ao ouvido peludo: "Consegues subir e descer quatro andares a pique até à Martinha? Prometes não mijar no chão envernizado? Prometes que não te passas por eu chegar tarde a casa todos os dias? E deixas a Carolina puxar-te o rabo sem retaliar?"
Não sei o que posso fazer. Neste momento, acho que o que ele precisa é de ir ao veterinário...

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