segunda-feira, novembro 14, 2005

Coisas pequenas

Começo este post sem título e sem a mínima ideia do que vou vomitar. Escrevo com o mesmo intuito que os gatos da Magui comem as ervas que ela semeia em algodões empapados de água, acondicionados em caminhas feitas de couvettes de esferovite do talho do Pingo Doce - é para me purgar.
Aqui purifico-me. Os felinos expelem bolas de pelo. Eu vomito palavras. E, de vez em quando, sai alguma coisa de jeito, no reino das "coisas pequenas" (Linha aqui atrás! Encontrei um título: coisas pequenas, as "coisinhas", como lhes chama o foto.poeta, pedaçinhos de realidade cortados do bloco de papel de lustro com tesouras de criança - a minha primeira tesoura era um Pai Natal coradinho -; é aquilo em que sou realmente boa, em que chego quase ao patamar do genial).
É perto da meia noite, e os caracteres sem carácter de ontem, o post meio doido sobre bicicletas, pesadelos e sonhos alucinados de casas que fazem figas por mim e batem na madeira do soalho de tábua corrida, para isolar os maus augúrios que teimam em me fazer esperas à porta de casa (cá para dentro não passam, dou de comer ao passaroco dourado da Mundial todos os dias, a águia fica em sentinela, de asas abertas e pose altiva e temerária, dia e noite, misturo nas sementes umas folhinhas de coca, nunca está cansada, nunca se queixa, fica ali quietinha sob um fundo carmim, a casa e o passaroco da Mundial escolheram-me a mim, não fui eu quem os escolheu a eles e prometeram, ambos, selaram um pacto, num dia de Outubro, nos escritórios de um banco britânico turquesa que também tem uma águia a protegê-lo do demónio do crédito mal parado, prometeram-me segurança, a mim e ao pedaço loiro de mim, para todo o sempre), esse comecei a escrevinhá-lo precisamente às zero zero zero zero, e nem tinha reparado, só há pouco ao ler os comentários da minha extensa audiência (o senhor que me desiludiu, o que tem Internet em todo o lado que vai com o seu mac prateado, continua com o mesmo ritmo de antigamente, entre três e cinco visitas por dia, e só por isso, pela persistência, pelo voyeurismo, o meu coração mole tem vontade de esquecer a grande desfeita de Paris), e parece que se impõe começar uma tradição, mais uma rotina de prazer: escrever momentos antes de me transformar em abóbora.
Ainda só escrevo com uma mão, devagarinho, já arrisco bater com o indicador da direita na barra do space, apenas esse movimento, mas a mão enferma, neste momento, está colada à boca, e a boca está aberta de espanto, a pele está arrepiada como a das galinhas, passei a tarde a adivinhar quebra-cabeças e fui o número perfeito 131. Tive direito a um prémio. E a metade de mim loira também. E está aqui.
Depois de o ler, não tenho coragem para escrever o que quer que seja, soa-me tudo mal. É um grave e sério caso de talento e espero que nunca se cure desse mal.
[Fico histérica quando tropeço em pessoas brilhantes, e estas pessoas neon, tão radioactivas como Chernobyl, só aparecem a quem vê as coisas pequenas.]

4 comentários:

SGTZ disse...

Escrever sem um fim em vista é uma das maravilhas de que sabe articular palavras. Escreve-se sem propósito, sem um tema, sem um objectivo, sem regras. Um fenómeno, quem sabe se não será um luxo, quem sabe se não será um defeito, quem sabe quantos caracteres é que eu conseguiria escrever aqui sem dizer nada minimamente aproveitável?

Anónimo disse...

as coisinhas são sempre de louvar, sejam tendinites ou flores cumprimentadas ou árvores contadas ou memórias reencontradas, são sempre de louvar as coisinhas que teimam em fazer-nos sentir vivos...
e assim me despeço: até já!

Mary Mary disse...

O mundo é feito das pequenas coisas. E é com elas que nos tornamos especiais e únicas no mundo. As coisas grandes todos conseguem fazer, agora as coisas pequenas...

Anónimo disse...

O bacalhau está com óptimo aspecto. :-)