quarta-feira, janeiro 25, 2006

Mãos ao baixo


Não tarda, chega a Hermínia, chega o João, não tarda, a casa tem que estar arrumada, a roupa estendida, o jantar feito, a árvore de natal tem que estar desmembrada no seu caixote até Dezembro próximo, não tarda tenho que subir ao escadote para arrumar no alçapão o caixote com as bolas, as fitas e e os pais natal de tecido em tons de cobre. É já não tarda, e as fadas do lar estão de folga, preguiçaram, deixaram tudo para eu fazer, o Chopin já toca - gosto de fazer a faxina ao som de música clássica, dá algum estilo à coisa -, não tarda nada a campainha toca e eu ainda estou agarrada ao macintosh, com tudo por fazer, e pelo menos tenho que plantar os amores perfeitos à janela, os amores perfeitos que salvei de uma morte certa à sede de um hipermercado da Jerónimo Martins, e à minha janela está uma foto incrível à espera: há os pombos no telhado do prédio gémeo siamês do outro lado da rua, há a vizinha com feições duras e cabelo grisalho, há o canário ao sol, mas a foto não está aí, está dois andares abaixo, na janela do vizinho que, invariavelmente, apanho de ceroulas à janela da cozinha, as paredes são azuis, vejo o tecto de madeira, vejo muito pouco, é uma cozinha sombria, invadida por uma enorme solidão, mas hoje, à janela, estão estendidas duas luvas de borracha cor-de-rosa, não sei se consigo captar com a Leica aquilo que os meus olhos vêem, mas isso, é não tarda.

O remetente deste email que me perdoe a perda de exclusividade deste pedaçinho. Tem todos os outros só para ele e, aliás, as minhas coisas não têm dono. São de quem as apanhar, são de quem as trata bem, com carinho.

2 comentários:

Anónimo disse...

A foto ficou realmente incrível. Tem um não sei que de abandono, de solidão, mas é linda.

Dia disse...

Mas não foi assim que os meus olhos a viram.
O Vring também não me arranja o photoshop e assim não há condições.