Menina mimada
Tenho saudades da minha mãe me secar o cabelo.
Até há seis meses atrás, ela tratava do assunto, um pouco como aqueles gabinetes de contabilidade que preenchem o IRS aos seres que têm alergia a termos encriptados como "deduções à colecta".
Juntam-se, durante o ano inteiro, os papéis, as facturas, se forem como eu, juntam-se folhas bonitas de arvores que se vão catando do chão, ou trevos de quatro folhas que se encontram no meio da relva, junta-se pacotes de açúcar bonitos (sobretudo os da Tofa que têm azulejos das fachadas de prédios de Lisboa), tudo para dentro de uma caixa de sapatos, e quando chega a altura, entrega-se tudo, caixa incluída, aos senhores cinzentões que passam oito horas por dia sentados num cubículo e que por cerca de 35 a 50 euros até tratam de entregar a nossa obrigação fiscal na repartição de Finanças, seja ela virtual ou não (e eu sou uma gaja destas, agora é que não vou mesmo conseguir dormir, gosto de cinzento - o vestido do Tenente é cinzento, o tal -, trabalho numa espécie de cubículo com vista para um plátano e entreguei, ainda este ano, não sei quantos anos de declarações do senhor incitável e até hoje, essa alta figura da blogosfera, me deve um almoço - e eu continuo com desejos de ir ao Snob comer um bife. E apesar desta dedicação, nem falo dos milhares de cafés que lhe sirvo, nem citá-lo posso... É incrível!).
E a Magui era o homem da Regisconta do meu cabelo até eu vir morar para debaixo da Duque de Loulé. Aquela máquina. Um ritual de cerca de uma hora, eu sentava-me no banquinho amarelo da casa de banho e ela a escovava, a enrolava, esticava, às vezes a encaracolava com o Babyliss velhote que comprou nos anos 70, e eu, por mim, saía com ele de qualquer jeito, gosto de tranças, aí é que pareço mesmo monhé, mas a Magui gosta de fazer promessas à custa do meu cabelo, e por isso, levou uma vida dedicada a estes cabelos que não são lisos nem encaracolados, que são escuros, mas reflectem a encarnado.
Quem quiser morar em mim tem que me secar o cabelo de vez em quando. São mais de 70 centímetros. Só para avisar.
1 comentário:
Eu tenho saudades de acordar com a minha mãe a coçar-me as costas...
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