Post às cinco da manhã (ou as árvores nunca são apenas árvores)
[Post escrito depois de lavar a loiça, depois de causar mais um dilúvio forçado no formigueiro da bancada de mármore da cozinha, depois de ter varrido o chão da casa toda, de ter colado um pedaço de papel de embrulho, com motivos infantis, na porta, com a leitura do contador da água. Post escrito depois de ter estado com o meu melhor amigo, o único homem em que eu acredito, o único que nunca me fez sofrer, de ter passado o tempo todo a olhar para ele, a memorizar o que o tempo e milhares de quilómetros de distância me levam da memória (as rugas junto aos olhos, quando se ri, e o verde azeitona dos seus olhos). Post escrito, única e exclusivamente, porque há leitores que pegam nesta tralha antes de lerem a jornalada, antes de saberem na Lusa se houve algum crash nos mercados internacionais.]
As árvores nunca são apenas árvores, disse-me o Leonardo, citando um senhor qualquer cujo meu cérebro não se deu ao trabalho de memorizar.
A Magui tem passado a última semana a ouvir motoserras a cortar os chopos dos nossos jardins.
As árvores nunca são apenas árvores e a minha mãe está a morrer de tristeza.
Não sai de casa, não me quer ver a mim ou à Carolina. Nem sequer me telefona para me acordar e, por isso, as manhãs têm sido mais compridas, mas os acordares mais tristes.
Ontem estive cinco minutos na Estados Unidos e revi a imagem dela, sentada na cadeira verde de plástico da sala dos gatos, a chorar em silêncio ao som de música celta do Alan Stivell.
Anunciou-me hoje, pelo telefone (fui eu quem tomou a iniciativa de procurar se ela estava viva), que não vai haver Natal este ano lá em casa.
As árvores nunca são apenas árvores e o Carmona podia ter distribuído uns panfletos a avisar o que pretende fazer com aqueles jardins e, francamente, podia ter alguma sensibilidade, e deixar passar as festas e só depois começar a chacina dos chopos da Estados Unidos (as árvores nunca são apenas árvores e matar uma árvore, mesmo que ela esteja doente, o que não me parece que seja o caso dos chopos da Estados Unidos da América, que sobrevivem Verões inteiros sem uma gota de água, dar eutanásia a uma árvore é sempre um crime).
As árvores nunca são apenas árvores, são recordações de um amigo, de um amigo como o Miguel é para mim, que morreu num Natal, faz já muito tempo.
As árvores nunca são apenas árvores, são saudades da mãe que decidiu partir, passados poucos minutos de um ano que acabara de começar.
Será apenas mais um Natal triste.
9 comentários:
como não sou religioso nem acredito em que possa haver nada depois do "grande finali", mas sei que as células que nos compõe vão ser distribuídas por algures seja em adubo, comida para outro ser (ainda) vivo ou fazer parte de um mineral... sou grande fã do "nada se perde, tudo se transforma".
por isso acredito que as células que tenho na minha constituição física deve haver um pouco de tudo, sim, até mesmo papel de embrulho de natal...
as árvores são sempre, apenas árvores..........
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Asseguir a umas, virão outras!...
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É sempre bom que exista lugar para as novas que chegam, nunca esquecendo as que partiram....
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As árvores são sempre apenas árvores? Mas que raio de comentário é esse? "Asseguir" que raio de palavra é essa?
Bom vá, viva a pluridade...
obrigada mpr.
eu estou tão triste e cansada que não consigo dizer mais nada.
sem sentido. alguém muito louco parece que quer envenar tudo. concordo com o que escreveste, a analogia que fizeste. das árvores e os humanos. são isso sim. um beijo. e o natal há-de ser...
As árvores nunca serão apenas árvores. Como o mar nunca é, nem as flores, nem as pedras da calçada. Todos têm uma história para contar. Todos têm memórias e recordações.
Espero que coloquem novas árvores. Nunca serão as mesmas, nunca o passado voltará. E no meio disto tudo só nos resta esperar e tentar preencher o vazio que ficou. E de preferência preencher com coisas boas...
Ganilho, tu és lindo e este blogue é terapia gratuita diária e ainda me desencanta amigos como tu e a Tété (eu gosto de lhe chamar Teresinha, como as rosinhas)
Lá estaremos, eu e o demónio. Levo a sobremesa?
e pode ser banho de mar a seguir? ahahahah
Promete, ai promete este nosso jantar de ressaca do Natal.
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